quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Tipos de Sofrimento


Muito do que sentimos (angústias, aflições, medos, impaciência, impermanência...) vêm da nossa própria natureza humana, de acharmos que tudo é causado por algo exterior. Sem nos darmos conta de que todo e qualquer sofrimento começa em si e é justamente processado em nós mesmos. Entender os vários tipos de sofrimento, serve como alerta para que tornemos esses sentimentos conscientes em nós mesmos e desta forma, consigamos transformá-los e extingui-los. Ter compaixão por nós mesmos é dar o primeiro passo.




1. SOFRIMENTOS PRIMÁRIOS

1.1. NÍVEL 1: SOFRIMENTO DO SOFRIMENTO: 
Associado a aversão ou medo da dor física.
Quando algo que nos causa dor surge como causa para desencadear mais dor. 
Existem duas formas de sofrimento do sofrimento: o sofrimento intrínseco à vida consciente e o sofrimento causado pelas tentativas de evitá-lo e fugir dele. 
O sofrimento intrínseco à vida consciente é expresso na tristeza: uma sensação de vazio decorrente da falta de um sentido para a vida.
O sofrimento do sofrimento é o mais comum da vida humana: todas as formas de sofrimento físico e mental relacionadas ao nascimento, ao envelhecimento, à doença e à morte, assim como estar ligado ao que se detesta, estar separado do que se ama e não realizar o que se deseja. 
Quando uma coisa ruim acontece logo após outra, e as situações estão indo de mal a pior, podemos achar que estes são momentos de azar, de infortúnios, mas na realidade, eles expressam algo bem mais fundamental: a nossa própria impotência frente à Realidade Imediata. E quando estamos impotentes, não temos saída senão aceitar as coisas como se dão. Essa é a grande sabedoria que as situações de sofrimento contínuo têm a nos ensinar.



1.2. NÍVEL 2: SOFRIMENTO DA IMPERMANÊNCIA:

Associado ao apego às experiências prazerosas e a dor de seu término.
Impermanência: produção e desintegração constantes. Existem 2 tipos:
Densa: transitoriedade da vida, o envelhecimento e a inevitabilidade da morte.
Sutil: transitoriedade das coisas, mudança constante de momento a momento.
O sofrimento produzido por mudança é expresso na busca de prazeres e de estados de alegria transitórios, que levam a mais sofrimento por sua natureza provisória e inconsistente. 
Esse tipo de sofrimento também ocorre quando nos recusamos a admitir a natureza impermanente da vida. Apesar de intelectualmente sabermos que tudo muda constantemente e de modo imprevisível e emocionalmente lutamos para aceitar esta verdade. Ao fazermos isso, nos sentimos inseguros, nada nos parece confiável e tudo se torna insatisfatório para nós. 
A realidade externa é, por natureza, incerta, portanto, não podemos ter garantias com relação a ela. A pessoa insegura é justamente aquela que busca controlar a realidade externa. A pessoa segura é aquela que aceita a sua insegurança.
Os mestres budistas,  vivem a vida, ao invés de tentar controlá-la. 



1.3. NÍVEL 3: SOFRIMENTO DA EXISTÊNCIA CONDICIONADA OU DA EXISTÊNCIA NÃO ILUMINADA:

Associado a ignorância de não compreender e não saber como sair da existência cíclica.
Na maior parte do tempo, lutamos contra a realidade da existência do sofrimento. Buscamos desesperadamente dicas para driblá-lo, na esperança de que seja possível evitá-lo. Mas a Primeira Nobre Verdade nos ensina que nada disso adianta. Enquanto houver ignorância (ausência de conhecimento), haverá sofrimento.
É preciso encarar o sofrimento para eliminá-lo. Encarar aqui não significa desafiar, e sim, simplesmente pôr-se diante dele para conhecer a sua natureza, sem julgá-lo como justo ou injusto, certo ou errado. 
O que intensifica a dor de um sofrimento é o sentimento de indignação frente a ele, ou seja, é a nossa importunação diante do sofrimento que faz com que ele aumente e tome conta de todo o nosso ser.
Uma vez que aprendemos a nos responsabilizar pela maneira como lidamos com o sofrimento, passamos a entender que não precisamos nos tornar vítimas dele.
Nos tornamos vítimas do sofrimento quando não o aceitamos e lidamos com ele como se ele estivesse fora de nós, projetando, assim, a causa de nossa dor nos outros. Acolher o nosso sofrimento é o único modo de sair do ressentimento e das projeções. 
É preciso ter empatia por nosso sofrimento: ter compaixão por ele, isto é, despertar um interesse genuíno por conhecê-lo e querer transformá-lo.
É importante compreender como a pessoa vivencia e interpreta uma situação, e sentir empatia pela realidade simbólica dessa pessoa. Quando a parte da pessoa que se identifica com a realidade do esquema sente que está recebendo empatia, ela pode começar a se abrir a outras perspectivas, o que inclui começar a perceber como a lente do esquema distorce suas percepções e reações.
Se não formos empáticos com nosso sofrimento, poderemos buscar esta empatia no reconhecimento alheio. Isto é, muitas vezes, sem nos darmos conta, alimentamos o sofrimento por meio de lamentações que nada mais são do que tentativas de sermos reconhecidos, pelos outros, por aquilo que estamos passando. Mas, de fato, este reconhecimento pouco nos ajuda. Será ao sentir compaixão por nós mesmos, que conseguiremos parar de nos lamentar e decidir, de fato, fazer algo para sair do sofrimento e das causas do sofrimento.



2. SOFRIMENTOS SECUNDÁRIOS

-Dor de sermos separados daqueles que amamos por circunstâncias existenciais (guerras, catástrofes) ou morte.
-Dor se sermos obrigados a conviver com quem não queremos ou vivenciar situações desagradáveis (assaltos, sequestros).
-Dor de não conseguir realizar um sonho (casar, enriquecer, o de ter filhos).
-Dor de perder posses e realizações (carro, casa, emprego)


segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Os Preparativos - 1° Meio que Transforma a Mente

O objetivo da prática do Dharma é alcançar um estado de genuíno de bem-estar que flui de uma fonte de conscientização pura e clara, que surge não de estímulos dos prazeres sensoriais, mas da natureza da Consciência Pura. Isto traz não somente uma sensação feliz, bem como um modo de ser que fundamenta e permeia todos os estados emocionais. Lida com a vida sem confusão, leva a plenitude do ser e conduz a um estado genuíno e duradouro de felicidade e que desta forma não depende de estímulos.

O Dharma é como um medicamento: destina-se a ajudar a interromper comportamentos e atitudes habituais que impedem a capacidade da mente de se curar ou de iluminar-se. Quanto mais você pratica o Dharma, mais ele revelará sua felicidade inata. O Treinamento da Mente é a essência do Dharma, e consiste em etapas que iniciam com os preparativos. 

O necessário é impregnar a mente com dois desafios: uma extensa avaliação da vida comum e uma extensa avaliação do potencial humano. Na verdade, OS PREPARATIVOS são a essência da evolução. Os preparativos são Quatro Meditações discursivas tradicionais chamadas de “Os Quatro Pensamentos que Mudam a Mente”. Estas meditações mudam nossa mente para a direção das nossas aspirações mais elevadas e reordenam progressivamente as prioridades. A meditação discursiva é refletir sobre assuntos escolhidos e pode ser realizada a qualquer momento.

O Primeiro dos Quatro Pensamentos:

A Rara e Preciosa Vida Humana 
Algumas pessoas vivem em condições nas quais não existe lazer e alegrias. E cada inspiração está comprometida subsistir, ou seja, em conseguir alimento, em manter-se abrigado, procurar segurança ou em desviar-se de bombas, por exemplo. Se você vive em uma área de pestilência, fome ou guerra, você não tem lazer, não tem tempo, não sente a verdadeira felicidade.

Esta primeira meditação discursiva aumenta o apreço pelo tempo livre. Devemos aprender a utilizar nosso tempo livre para respirar o presente, e preencher o nosso coração vazio com Dharma. 
É preciso também reconhecer nossa oportunidade, por termos nascido como seres humanos, de assim compreender o Dharma, coisa que não é possível em outros reinos. Reconhecendo a oportunidade única de ter nascido com alguma ou outra condição, discernimento e inteligência para compreender a vida e oportunizar o despertar espiritual e a felicidade genuína que são uma joia rara.

A prática espiritual se dirige às causas fundamentais do sofrimento e requer que examinemos de perto os preconceitos que mantêm nossa visão de mundo e perpetuam nossos problemas. Embora o sucesso pareça ser a fonte dos bons momentos da vida, a felicidade incluída, não é o objetivo da prática espiritual. Nossas idéias sobre sucesso são baseadas em preconceitos que no budismo, são chamados de “as oito preocupações mundanas”.  A fixação nessas preocupações subverte nossos  melhores esforços, conduzindo a um falso sucesso ou a uma real frustração.
As oito preocupações mundanas consistem em quatro pares de prioridades: 
  • Buscar aquisições materiais e evitar sua perda; 
  • Buscar o prazer dirigido pelo estímulo e evitar o desconforto; 
  • Buscar o elogio e evitar a culpa; 
  • Manter boa reputação e evitar a má reputação. 

Estas oito preocupações resumem, em geral, nossa motivação pela busca da felicidade e eis aqui o problema. Estas preocupações, mesmo não sendo erradas em si, sustentam nossa motivação e é a motivação, mais do que qualquer outro fator, que determina o resultado da nossa prática espiritual, se será algo bom e construtivo ou se será algo doloroso e ruim.

A verdadeira fonte da felicidade não está no domínio das oito preocupações mundanas. Sejam ricos, pobres, elogiados, culpados, estimulados, entediados, respeitados, ultrajados e etc. – nenhuma destas preocupações são em si fontes de felicidade e não impedem a felicidade.
Porém, o problema é que quando encaramos as preocupações mundanas como um meio para a felicidade, a vida se torna um jogo de dados em que não há garantias.
Não espere até você ter 80 anos para compreender as deficiências das oito preocupações mundanas, examine suas prioridades agora. Também não há necessidade de rejeitar estas preocupações por completo. O imprescindível é desviar seu investimento primário de outros pontos para o Dharma genuíno. Quando você mudamos nossas prioridades e voltamos para a prática espiritual, todo o contexto de vida vai trabalhar a favor desta mudança e vamos perceber que os benefícios das preocupações mundanas vão se alinhar a nossa prática.

A “preciosidade” se refere ao nosso potencial humano para eliminar as fontes de sofrimento do nosso próprio ser, para transformar a mente de modo que, independente das circunstâncias, não precisemos sofrer novamente pelas mesmas aflições mentais.  
Mas de que maneira? Identificando e erradicando, de modo progressivo, todas as aflições que são fontes de sofrimento. E ao mesmo tempo, percebendo e intensificando a compaixão por nosso próprio sofrimento e o sofrimento alheio.

O grande tesouro está na verdade dentro de nossa mente e coração. Mestres, tradições, técnicas, todos têm o único propósito de ajudar a revelar aquilo que já está dentro de nós, do contrário ainda não compreendemos muito bem o real valor do Dharma. O Dharma genuíno consiste então, nos métodos para revelar o que já está dentro de nós e isto é preparar nossa mente para as mudanças que transformam o nosso meio e nossa prática espiritual.

Namastê!!

domingo, 10 de novembro de 2013

Os Quatro Pensamentos Imensuráveis (parte II)

Depois de começar a entender o que é amor na visão budista, te convidamos a continuar refletindo sobre o tema no texto dessa semana.
No texto, Thich Nhat Hanh ensina os outros dois aspectos dos quatro referentes ao verdadeiro amor, segundo a filosofia budista. O terceiro aspecto do verdadeiro amor é mudita, a alegria. O verdadeiro amor sempre proporciona alegria, para nós e para as pessoas que amamos. Se nosso amor não trouxer alegria para as duas partes, não será um verdadeiro amor. O quarto aspecto do verdadeiro amor é upeksha, que significa equanimidade, desapego, não-discriminação, serenidade mental, ou a capacidade para deixar as coisas seguirem.

O terceiro elemento que é parte do amor é mudita, a alegria. O verdadeiro amor sempre proporciona alegria, para nós e para as pessoas que amamos. Se nosso amor não trouxer alegria para as duas partes, não será um verdadeiro amor. Os comentaristas budistas explicam que a felicidade está relacionada ao corpo e à mente, enquanto que a alegria se relaciona basicamente com a mente. Um exemplo muito citado é o seguinte: Alguém está atravessando um deserto e vê um riacho de água fresca. Nesse momento, a pessoa experimenta alegria. Ao beber a água, a pessoa experimenta a felicidade.

Drishta dharma sukha viharin significa "estar feliz no momento presente". Não nos lançamos ao futuro, porque sabemos que tudo o que importa está aqui, agora. Muitas pequenas coisas podem nos proporcionar alegria, como por exemplo a lembrança de que temos um par de olhos em bom estado de funcionamento. Só precisamos abrir nossos olhos, para enxergar o céu azul, as flores violetas, as crianças, as árvores, além de muitas outras formas e cores. Com nossa atenção, atingimos todas estas coisas maravilhosas e renovadoras, e a alegria surge naturalmente em nossas mentes. A alegria contém felicidade, assim como a felicidade contém a alegria.

Alguns comentaristas já disseram que mudita significa "alegria empática" ou "alegria altruísta", ou seja, a felicidade que sentimos ao ver pessoas felizes. Mas isso é muito limitado, porque implica uma separação entre o "eu" e os outros. Uma definição mais profunda de mudita é a alegria repleta de paz e de contentamento. Nós nos alegramos ao ver outras pessoas, mas também nos alegramos com o nosso próprio bem-estar. Como podemos nos alegrar por outra pessoa, se não sentimos alegria por nós mesmos? A alegria é para todos.

O quarto elemento do verdadeiro amor é upeksha, que significa equanimidade, desapego, não-discriminação, serenidade mental, ou a capacidade para deixar as coisas seguirem. Upa quer dizer "acima" e iksh significa "olhar". Você sobe uma montanha para poder olhar de cima, para a situação como um todo, sem se limitar a um lado ou a outro. Se o amor contiver apego, discriminação, preconceito ou desejo, não será um amor verdadeiro. As pessoas que não conhecem o budismo pensam que upeksha significa indiferença, mas a verdadeira equanimidade não é fria nem indiferente. Se você tem mais de um filho, todos são igualmente seus filhos. Upeksha não significa que você não os ama, mas que ama de tal maneira que todos os filhos recebem amor, sem discriminação.

Upeksha traz a marca chamada samatajnana, "a sabedoria da igualdade", a capacidade de ver todos como iguais, de não discriminar entre o "eu" e os outros. Em um conflito, mesmo que estejamos envolvidos, permaneceremos imparciais, capazes de amar e entender ambos os lados. Abandonamos toda a discriminação e o preconceito, removendo as barreiras entre nós e os outros. Enquanto enxergarmos a nós mesmos como aquele que ama, e o outro como aquele que é amado, enquanto dermos mais valor a nós mesmos do que aos outros, e nos considerarmos diferentes dos outros, não teremos atingido a verdadeira equanimidade. Temos que aprender a nos colocar no lugar da outra pessoa, tornando-nos unos com essa pessoa, se quisermos realmente compreender e amar o outro. Quando isso acontece, deixam de existir o "eu" e o "outro".

Sem upeksha, o amor se torna possessivo. Uma brisa de verão talvez seja refrescante, mas se tentarmos enlatar a brisa para tê-la ao nosso dispor, a brisa morrerá. Com as pessoas que amamos acontece a mesma coisa. A pessoa amada é como uma nuvem, uma brisa ou uma flor. Se você aprisioná-la em uma lata ela morrerá. Entretanto, muitas pessoas fazem exatamente isto. Tiram a liberdade de seus seres amados até o ponto onde a outra pessoa não consegue mais ser ela mesma. Vivem para satisfazer seus próprios desejos, usando o ser amado para ajudá-los a fazer isso. Isso não é amar, é destruir. Você diz que ama a pessoa, mas se não tentar entender seus anseios, necessidades e dificuldades, a pessoa viverá em uma prisão chamada de amor. O verdadeiro amor preserva a liberdade das duas pessoas, e é isso que é upeksha.

Para que o amor seja verdadeiro, precisa conter compaixão, alegria e equanimidade. Para que a compaixão seja verdadeira, deve conter alegria, amor e equanimidade. Da mesma forma, a verdadeira equanimidade precisa conter amor, compaixão e alegria. Essa é a natureza interdependente dos Quatro Pensamentos Imensuráveis. Quando Buda disse ao brâmane para praticar os Quatro Pensamentos Imensuráveis, estava nos oferecendo um ensinamento importante. Mas é preciso que tenhamos a disciplina de contemplar tudo isso e praticar por nós mesmos os quatro aspectos do amor, trazendo o ensinamento para nossas próprias vidas e para as vidas daqueles que amamos. Em muitos sutras, Buda diz que se praticarmos os Quatro Pensamentos Imensuráveis juntamente com as Quatro Nobres Verdades e o Nobre Caminho Óctuplo, nunca mais desceremos ao reino da dor e do sofrimento (Sansara).

(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh) 
FONTE:  http://sangavirtual.blogspot.com

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Os Quatro Pensamentos Imensuráveis (parte I)

No tempo de Buda, os brâmanes rezavam pedindo para que quando morressem pudessem ir para o Céu residir eternamente na companhia de Brahma, o Deus universal. Um dia um brâmane perguntou ao Buda: "O que posso fazer para ter certeza de que irei ter com Brahma quando morrer?" e o Buda respondeu: "Sendo Brahma para você a fonte de todo o Amor, para estar com ele você precisa praticar as 'Quatro Moradas de Brahma', (Brahmaviharas) ou Os Quatro Pensamentos Imensuráveis - Amor, Compaixão, Alegria e Equanimidade" (Amor em sânscrito é maitri; em páli é metta. Compaixão é karuna nas duas línguas. Alegria é mudita. Equanimidade é upeksha em sânscrito e upekkha em páli. Uma vihara é uma morada, ou um lugar de habitação). As Quatro Brahmaviharas são as quatro moradas do Amor Verdadeiro. Este é um endereço muito melhor para se morar do que um hotel cinco estrelas. É uma morada de mil estrelas. As Quatro Brahmaviharas são chamadas de "imensuráveis" porque quando são praticadas crescem todos os dias dentro de nós, até abraçarem o mundo todo. Nós nos tornamos mais felizes, e aqueles que estão ao nosso redor também se tornam mais felizes.

Buda respeitava o desejo das pessoas de praticar a própria fé, e por isso incentivou o brâmane em sua própria crença. Se você gosta de meditação caminhando, deve praticá-la. Se preferir meditação sentada, faça isso. Mas preserve suas raízes cristãs, judaicas ou muçulmanas. Esta é a melhor maneira de entrar em sintonia com o espírito de Buda. Se você cortar suas raízes, não conseguirá ser feliz. Se praticar amor, compaixão, alegria e equanimidade, saberá curar as doenças representadas por sentimentos tais como raiva, tristeza, insegurança, depressão, ódio, solidão e apegos doentios.

Alguns comentaristas dos sutras disseram que as Brahmaviharas não são o ensinamento mais elevado de Buda e que elas não conseguem colocar um fim no sofrimento nem nas aflições, mas isso não é correto. Certa vez, Buda disse a Ananda: "Ensine os Quatro Pensamentos Imensuráveis aos jovens monges, para que eles se sintam mais seguros, fortes e alegres, sem aflições no corpo ou na mente. Assim, durante toda a vida, eles estarão melhor equipados para praticar a vida pura de um monge."

Em outra ocasião, um grupo de discípulos do Buda visitava o mosteiro de uma seita vizinha, e os monges de lá perguntaram: "Ouvimos dizer que seu instrutor Gautama ensina os Quatro Pensamentos Imensuráveis do amor, compaixão, alegria e equanimidade. Nosso mestre também ensina isso. Qual é a diferença?" Os discípulos de Buda não sabiam responder. Quando voltaram ao mosteiro, o Buda lhes disse: "Quem pratica os Quatro Pensamentos Imensuráveis juntamente com os Sete Fatores do Despertar, as Quatro Nobres Verdades e o Nobre Caminho Óctuplo chegará sem dúvida à iluminação." Amor, Compaixão, Alegria e Equanimidade são a própria natureza da pessoa iluminada. São os quatro aspectos do verdadeiro amor dentro de nós, dentro das outras pessoas, e na verdade dentro de todas as coisas.

O primeiro aspecto do Amor Verdadeiro é justamente o Amor (maitri), que é a intenção e a capacidade de proporcionar alegria e felicidade. Para desenvolver essa capacidade, temos que praticar o enxergar e o ouvir em profundidade, para saber o que devemos fazer e não fazer para poder proporcionar felicidade aos outros. Se você oferecer à sua amada algo de que ela não precisa, isso não será maitri. Você tem que ser capaz de observar a verdadeira situação dela, senão suas ofertas correm o perigo de causar infelicidade.

No Sudeste da Ásia, muitas pessoas gostam de uma fruta grande e espinhosa chamada durian. Poder-se-ia inclusive dizer que são viciados em durian. O cheiro é muito forte, e algumas pessoas, quando acabam de comer essa fruta, colocam a casca embaixo da cama, para continuar a sentir seu cheiro. Eu, particularmente, acho horrível o cheiro de durian. Certa vez, quando eu cantava um sutra em meu templo no Vietnã, havia um durian sobre o altar, que havia sido oferecido a Buda. Eu tentava recitar o Discurso do Lótus, usando um tambor de madeira e um sino grande em forma de tigela como acompanhamento, mas tive dificuldades para me concentrar. Finalmente, levei o sino até o altar e o virei de boca para baixo por cima da fruta, para cobrir o durian, na esperança de conseguir cantar o sutra. Depois que terminei, fiz uma reverência diante de Buda e libertei o durian. Se você me dissesse: "Thây, eu o amo muito e gostaria que você comesse um pouco deste durian", eu sofreria. Se você me ama certamente vai querer que eu seja feliz, e, entretanto está me forçando a comer durian. Esse é um exemplo de amor sem compreensão. Sua intenção é boa, mas você não tem a compreensão correta.

Sem compreensão, o amor não é Amor Verdadeiro. É preciso observar em profundidade para poder enxergar e compreender as necessidades e aspirações, bem como o sofrimento daqueles que amamos. Nós todos precisamos de amor. Amor nos proporciona alegria e bem-estar. É natural como o ar que respiramos. Somos amados pelo ar, por isso precisamos de ar para ser felizes e nos sentir bem. Também somos amados pelas árvores, por isso necessitamos das árvores para nos manter saudáveis. Entretanto, para ser amados temos que amar, o que significa que precisamos compreender. Para que nosso amor possa se desenvolver, temos que escolher a ação ou a não-ação adequadas, de forma a proteger o ar, as árvores e aqueles que amamos.

Maitri pode ser traduzida como "amor" ou "bondade amorosa". Alguns mestres budistas preferem "bondade amorosa", porque acham que a palavra "amor" é uma palavra perigosa. Mas eu prefiro "amor". As palavras às vezes também adoecem, e nós temos que curá-las. Nós temos usado palavras que significam amor quando na verdade queremos dizer apetite ou desejo, como por exemplo, "eu amo hambúrgueres". Deveríamos usar a linguagem de uma forma mais cuidadosa.

"Amor" é uma linda palavra; seu verdadeiro sentido deveria ser restaurado. A palavra "maitri" tem o mesmo radical que a palavra "mitra", que significa amigo. No budismo, o sentido fundamental do amor é a amizade. Todos nós temos dentro de nós as sementes do amor. Podemos desenvolver essa fonte maravilhosa de energia, nutrindo o amor incondicional, aquele que não espera nada em troca. Quando chegamos a compreender alguém profundamente, inclusive alguém que nos prejudicou, não conseguimos deixar de amar essa pessoa. Shakyamuni Buda declarou que o Buda da próxima era se chamará "Maitreya, o Buda do Amor".

O segundo aspecto do Amor Verdadeiro é a Compaixão (karuna), a intenção e a capacidade de soltar e transformar o sofrimento, aliviando a tristeza. Karuna é geralmente traduzida como "compaixão", mas isso não é totalmente correto. "Compaixão" é uma palavra composta de com ("junto com") e paixão ("sofrimento"). Mas nós não precisamos sofrer para remover o sofrimento de uma outra pessoa. Os médicos, por exemplo, são capazes de aliviar o sofrimento de seus pacientes sem passarem eles mesmos pela doença. Se sofrermos demasiado seremos esmagados, tornando-nos incapazes de ajudar seja quem for.

Para conseguirmos desenvolver um grau maior de compaixão dentro de nós, devemos praticar a respiração consciente, e ouvir e enxergar com atenção plena. O Discurso do Lótus descreve Avalokiteshvara como o bodisatva que pratica olhando com os olhos da compaixão e ouvindo atentamente os gritos do mundo. A compaixão contém em si uma profunda preocupação pelo outro. Ao saber que o outro está sofrendo, você se senta perto dessa pessoa, observa-a em profundidade e ouve com atenção, para conseguir atingir sua dor. Isso é comunicação profunda, é comunhão com o outro, e é suficiente para proporcionar um enorme alívio a quem sofre.

Uma única palavra, ação ou pensamento compassivos de nossa parte têm o poder de aliviar o sofrimento de outra pessoa, trazendo alegria. Uma única palavra é capaz de proporcionar conforto e confiança, eliminar dúvidas, ajudar alguém a não cometer um erro, reconciliar um conflito, ou abrir a porta da libertação. Uma ação pode salvar a vida de alguém ou ajudar essa pessoa a aproveitar uma oportunidade rara. Um pensamento também tem o mesmo poder, porque os pensamentos sempre conduzem a palavras e ações. Quando existe compaixão no coração, qualquer pensamento, palavra ou ação são capazes de produzir milagres.

Quando eu era noviço, não conseguia entender por que o Buda tem um sorriso tão lindo se o mundo está repleto de sofrimento. Será que ele não se incomoda com tanta dor? Mais tarde, descobri que Buda tem em si grandes quantidades de compreensão, calma e força, razão pela qual o sofrimento do mundo não o aniquila. Ele consegue sorrir para o sofrimento porque sabe lidar com ele e transformá-lo. Precisamos ter consciência do sofrimento que existe no mundo, mas sem perder nossa clareza, nossa calma e nossa força, para que possamos ajudar a transformar as situações. Um oceano de lágrimas não nos afogará desde que haja karuna (compaixão). É por isso que o sorriso do Buda é possível.

(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)
FONTE: http://sangavirtual.blogspot.com

domingo, 13 de outubro de 2013

O que é o Budismo Engajado?

Por Antonino Condorelli

"Por Budismo Socialmente Engajado ou, simplesmente, Budismo Engajado entende-se o envolvimento ativo por parte dos praticantes budistas na sociedade e seus problemas, visando aliviar a dor dos outros, transformar as raízes que produzem injustiça e exploração e promover a paz, a igualdade, a solidariedade, os direitos humanos e a harmonia entre todos os seres.

A expressão Budismo Engajado, criada na década de 1960 por uma encarnação viva do Dharma, o mestre Zen vietnamita Thich Nhât Hanh, para referir-se ao trabalho dos movimentos budistas em prol da paz e os direitos humanos em meio à destruição e as atrocidades da guerra, hoje abrange um amplo leque de organizações, grupos e indivíduos que em muitos países do mundo dedicam-se a praticar os ensinamentos do Buda no coração da dor, com ações e projetos que visam aliviar o sofrimento das pessoas oprimidas por situações de miséria, exploração, privação da liberdade, violência física, psicológica ou sexual e outras formas de negação da dignidade humana, promovendo um novo modelo sociedade que se baseie na percepção da íntima interconexão de tudo o que existe.

A expressão é, na verdade, uma redundância. O Dharma, o caminho do amor e da compreensão traçado pelo Buda Siddharta Gautama há mais de 2.500 anos, é por sua natureza engajado, pois não pode existir longe e independentemente da vida das pessoas, não faz sentido fora do dia a dia e não se nega a enfrentar a dor, mas a encara de frente para transformá-la. Os ensinamentos budistas não são um sistema de crenças vindas de fora às quais aderir: são instrumentos práticos para libertar-se da dor, para cultivar a compaixão, o amor e a equanimidade e para chegar a uma compreensão profunda da realidade. Nascem da vivência e só adquirem valor dentro da experiência. Não são um conjunto de idéias em que acreditar: são uma forma de viver.

Uma forma diferente da que estamos acostumados: viver o Dharma é estar em contato com o sofrimento que permeia a existência conscientes da beleza sempre presente em cada instante da vida, é viver sem descriminar, sem julgar, sem separar, reconhecendo a dignidade, a igualdade essencial e a estreita interdependência de todos os seres, o milagre representado por cada fenômeno do universo, porque absolutamente tudo possui a essência de Buda, a natureza da compreensão, o amor e a liberdade. Viver o Dharma não é outra coisa do que viver para aliviar o sofrimento e levar felicidade aos outros. Por isso, o Budismo não pode ser senão “engajado”.

Mas nos anos Sessenta, no Vietnã e outros países asiáticos foi necessário “devolver” ao Dharma esta sua natureza originária desafiando as estruturas e mentalidades patriarcais, engessadas e afastadas da sociedade que caracterizavam a maioria das instituições budistas. Neste processo de reforma e revitalização do Budismo, a partir do caráter intrinsecamente flexível e estritamente vinculado à vida real deste último, verificou-se uma natural confluência entre o Dharma do Buda e elementos contemporâneos que partilham de ideais e princípios análogos como o feminismo, o princípio gandhiano da não-violência ativa e a ecologia profunda.

Desde o coração da Ásia, nas últimas décadas o Budismo Engajado propagou-se pelo chamado “Primeiro Mundo” e hoje conta com uma ampla e articulada rede de entidades e movimentos empenhados em cultivar a paz e a compaixão e em propagar os direitos humanos, o respeito ao meio ambiente e a solidariedade pelo mundo afora. Muitas destas organizações integram o International Network of Engaged Buddhists (Rede Internacional de Budistas Engajados), com sede na Tailândia.

Entre os principais movimentos budistas engajados, destacam-se a Ordem do Interser (Tiep Hien), fundada em 1964 por Thich Nhât Hanh no Vietnã e presente hoje em muitos países, que tem seu núcleo central no Centro de Meditação de Plum Village no Sul da França e está empenhada em atividades ao redor do mundo de resgate de refugiados, promoção do desenvolvimento sustentável, propagação da paz, a não-violência, os direitos humanos e o respeito ao meio ambiente; as atividades de Sua Santidade o XIV Dalai Lama, Prêmio Nobel da Paz em 1989, não apenas para a liberdade do povo tibetano, vítima da invasão chinesa, mas de propagação incansável dos princípios da não-violência e a compaixão como soluções para os graves conflitos da nossa época.

As atividades da comunidade de Samdech Phra Maha Ghosananda, monje Theravada falecido em março de 2007, que foi apelidado “O Gandhi da Camboja” pelo seu trabalho em prol da paz, a justiça social e os direitos humanos no seu país natal; os trabalhos de Sulak Sivaraksa, intelectual e ativista tailandês de inspiração budista, fundador da Sathirakoses Nagapradeepa Foundation e várias outras organizações, que conta com uma trajetória de cerca de setenta anos de atividades em prol da justiça social, a paz, a democracia e o desenvolvimento sustentável.

Muitos outros movimentos e organizações dedicam-se a praticar o Dharma como uma força de transformação social em países como Índia, Sri Lanka, Tailândia e também Estados Unidos, Austrália e diversos países da Europa Ocidental."

"A escuta profunda e a fala amorosa podem nos ajudar a apoiar a transformação dos indivíduos e da sociedade e nutrir o despertar coletivo que irá salvar nosso planeta e nossa civilização."
(Thich Nhat Hanh) 

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Antonino Condorelli, é comunicador e educador engajado ativamente na luta por uma sociedade justa, democrática, igualitária, pacífica, solidária e participativa, abraçou a causa da promoção e defesa incondicional de todos os direitos humanos desde 2003, quando integrou à equipe do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) de Natal, Rio Grande do Norte, na Região Nordeste do Brasil. Trata-se da organização-não-governamental que coordena a Rede Estadual de Direitos Humanos - RN e que produziu e gerencia a DHnet - Rede Direitos Humanos e Cultura, o portal que possui o maior e mais completo acervo de dados e informações sobre direitos humanos e cidadania em língua portuguesa. 

É praticante Zen informalmente ligado à Ordem do Interser do mestre Zen vietnamita Thich Nhât Hanh, fundador e principal protagonista do Budismo Socialmente Engajado. Paulo embasa suas ações nos princípios da universalidade, indivisibilidade, interdependência e inter-relacionamento de todos os direitos humanos; da ecologia profunda, ou seja, a convicção de que o ser humano é parte integrante física, psicológica e espiritualmente do ambiente em que vive e, portanto, a natureza possui um inestimável valor em si mesma, independentemente da utilidade material que tem para o homem; e da não-violência ativa, inspirada na ideia gandhiana de que “não há caminho para a paz, a paz é o caminho”.


FONTE: http://budistasengajados.blogspot.com

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

As Três Jóias do Budismo


Tomo refúgio em Buda, aquele que me mostra o caminho nesta vida. 
Tomo refúgio no Dharma, que é o caminho da compreensão e do amor.
Tomo refúgio na Sangha, a comunidade de plena consciência e harmonia.

      As pessoas buscam na religião um ponto de apoio para nortearem suas vidas. Na religião cristã, por exemplo, o ponto de apoio é Deus, que é Uno em três pessoas: Pai, Filho (Jesus) e Espírito Santo. Para nós budistas, encontramos nosso ponto de apoio nas chamadas Três Jóias (ou Três Tesouros ou Três Refúgios).
   O Buda (o Desperto), o Dharma (a Lei ou a Doutrina) e a Sangha (a Comunidade dos Discípulos/seguidores). É se apoiando nas Três Jóias que nós budistas alcançamos a energia e disposição para mudar o que pode ser modificado, conseguimos a coragem e a serenidade para aceitar o que não pode ser alterado, e obtemos o discernimento para distinguir uma coisa da outra.
     Segundo Thay, na tradição budista praticamos estes Três Refúgios. Onde buscar/tomar refúgio é o reconhecimento e a determinação em se dirigir para o que é mais bonito, verdadeiro, pleno e bom. Tomar refúgio é também a consciência que se possui, a capacidade de entendimento e do amor.

  Buda é a pessoa histórica que viveu 2600 anos atrás e todos os nossos professores ancestrais que nos conectam ao estado de Buda. É o homem desperto ou iluminado que tomou plena consciência do significado da vida e do caminho que liberta o ser humano do sofrimento. Buda é aquele que nos mostra o caminho nesta vida.  Buda é também a natureza desperta em todos os seres. Cada elemento no universo que está nos mostrando o caminho do amor e do entendimento, é natureza Buda. Os olhos abertos de uma criança e os raios de sol que fazem com que a flor abra sua beleza, também contém a natureza desperta de Buda. Nós budistas tomamos refúgio no Buda por ser ele o Sábio, o Conhecedor de tudo, aquele que com sua Compaixão indica-nos o caminho que o aliviará da angústia e do sofrimento.

O Dharma é a Doutrina, pregada pelo Buda, que expõe a Lei Suprema que fundamenta e rege toda a existência e que, quando compreendida e assimilada, liberta o homem do sofrimento e lhe proporciona a mais profunda e inquebrantável paz de espírito. Nós budistas tomamos refúgio no Dharma, assumindo o compromisso de ouvi-lo com constância e assiduidade, porque ele ilumina nossa existência, dissipando as trevas da ignorância, nos faz tomar consciência de nosso egoísmo e de nossas limitações, e nos conduz à salvação. É o Dharma que nos ensina que todas as coisas são impermanentes, dolorosas em sua transitoriedade, e desprovidos de substância própria, em sua mútua interdependência das coisas. É o Dharma que nos esclarece sobre a existência do sofrimento inerente ao nascimento, à doença, à velhice e à morte, sobre a ignorância, a cólera e o egoísmo, que são as causas do sofrimento, bem como sobre a possibilidade de se superar o sofrimento, através do Óctuplo Caminho que leva a essa superação: a visão correta, o pensamento correto, a palavra correta, a ação correta, a vida correta, o esforço correto, a intenção correta e a concentração correta. O Dharma, são todos os elementos no nosso mundo e na nossa consciência que nos guiam no caminho da liberação. O Dharma vivo é contido em cada canto do universo. Uma nuvem flutuando está silenciosamente pregando sobre liberação. É a folha caindo nos mostra a prática de "deixar ir". Cada vez que eu e você respiramos profundamente, andamos em plena consciência e olhamos outra pessoa com olhos de entendimento e compaixão, estamos dando um silencioso ensinamento do Dharma.

A Sangha é a Comunidade formada pelos fiéis discípulos do Buda, que vivem no seio da sociedade maior, em harmonia e fraternidade, respeitando a Vida, em todas suas manifestações, sempre assíduos em ouvir o Dharma e sempre prontos para transmitir sua fé aos demais. Nós budistas, tomamos refúgio na Sangha porque ela é a legítima sociedade fraterna formada pelos que trilham o Caminho da Sabedoria e Compaixão ensinado pelo Buda Desperto. Desta forma, Sangha é a comunidade que vive em harmonia e consciência. Seus professores, seus amigos e você mesmo são elementos da sua própria Sangha. Um caminho na floresta pode significar um membro de sua Sangha, apoiando-o no caminho da transformação. Na Sangha podemos compartilhar nossas alegrias e dificuldades. Podemos nos deixar ir e relaxarmos no calor e na força de nossa Sangha. A Sangha é o rio, fluindo e serpenteando com flexibilidade, respondendo ao ambiente em que está localizada. Ao tomarmos refúgio na Sangha, nos juntamos à corrente da vida, fluindo e nos tornando Unos com todos os nossos irmãos e irmãs na prática.
. . .

  "Tomar refúgio no Buda significa reconhecer a semente da iluminação que está dentro de nós mesmos, a possibilidade de libertação. Também significa tomar refúgio naquelas qualidades que o Buda corporifica; qualidades como destemor, amor e compaixão. Tomar refúgio no Dharma significa se abrigar na lei, no modo como as coisas são. É reconhecer nossa submissão à verdade, permitindo que o Dharma se desdobre dentro de nós. Tomar refúgio na Sangha significa aceitar o suporte da comunidade, de todos nós ajudando uns aos outros em direção à iluminação e à liberdade"


Namastê!!

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Contribuições Budistas para a Construção de uma Sociedade Justa

Todos sabemos que a construção de uma sociedade justa, democrática e civil não depende apenas daquilo que fazemos mas, acima de tudo, daquilo que somos. Temos que ser a própria mudança antes que possamos fazer mudanças em nossa sociedade. Estar em paz é a base para gerar paz. Sem transformações e curas pessoais não seremos suficientemente calmos e compassivos para usar a fala amorosa e a escuta profunda, e nossos esforços não ajudarão a mudar nossa sociedade. Assim, nossa prática pessoal e a prática de nossa Sangha são essenciais para a mudança que queremos ver no mundo.

As raízes da guerra e do conflito estão dentro de nós. Temos que reconhecer as aflições dentro de nós, abraçá-las e transformá-las: raiva, ódio, discriminação, orgulho, desespero. A prática consiste em olhar profundamente suas raízes, compreendê-las e aprender a transformá-las. Precisamos dar ouvidos ao nosso próprio sofrimento e ao sofrimento de nossa família, comunidade e nação. Devemos ser capazes de ajudar uns aos outros a reconhecermos que essas aflições existem em cada um de nós e que ao longo de nossas vidas temos permitido o desenvolvimento dessas aflições.

Assim, cada um de nós deve assumir o compromisso de não regar as sementes de violência, ódio, discriminação e desespero que estão em nós. Em nossos relacionamentos, precisamos ajudar uns aos outros na prática, aprendendo sempre a ouvir o outro com compaixão, sempre utilizando a fala amorosa para ajudá-lo a reconhecer as aflições que carrega dentro de si. Também devemos usar a fala amorosa para regar as sementes de compreensão, compaixão, alegria e irmandade inerentes ao outro. Devemos nos ajudar para que possamos trazer a cura a nossas relações pessoais antes que possamos ajudar a curar a humanidade e a Terra. A cura é possível através de cada respiração, cada passo, cada pensamento, cada palavra e através dos atos mais simples, como sorrir para alguém.

A Terra está padecendo, nossa sociedade está padecendo e há tanto desespero e violência. Práticas budistas, como o Pensamento Correto (ou seja, pensar com base na não-discriminação, compaixão e compreensão), Fala Correta, Ação Correta e Modo de Vida Correto são cruciais para a cura de que todos necessitamos. Os jovens devem aprender a praticar o Nobre Caminho Óctuplo em suas famílias e nas escolas. As negociações de paz terão êxito apenas se ambas as partes em conflito tiverem compreensão mútua e souberem como fazer uso da escuta profunda e da fala amorosa. E este tipo de treinamento deve começar nos níveis mais básicos da educação. É isto que entendemos por educação da paz e é a forma de sairmos da guerra e da violência.

O Manifesto de 2000 da UNESCO contém 6 pontos e equivale à prática dos Cinco Treinamentos da Plena Consciência. Tanto os seis pontos quanto os Cinco Treinamentos abordam as questões de paz e justiça social no nível mais fundamental. Na tradição budista, após receber os Cinco Treinamentos da Plena Consciência, a pessoa que os tomou deve recitá-los a cada duas semanas e participar de sessões de estudo e discussões do Dharma para entrar mais a fundo em seus significados e para descobrir melhores formas de colocá-los em prática na vida diária, tanto na família como na sociedade.

Os Cinco Treinamentos nos ajudam a viver com mais simplicidade, dando-nos o tempo e a energia necessários para proteger a vida e ajudar aqueles que precisam realmente de nós. É possível ser feliz com uma vida simples, com tempo para tomarmos conta de nós mesmos, de nossa família, daqueles que sofrem e, ao mesmo tempo, promovermos uma justiça social maior. Muitos de nós correm atrás da fama, do poder, do sexo e do dinheiro durante toda a vida, mas mesmo aqueles que têm essas 4 coisas em abundância continuarão sofrendo muito se não tiverem compreensão e amor.

Quando praticamos o segundo treinamento da generosidade para oferecermos nosso tempo, energia e recursos materiais àqueles que necessitam realmente deles, nossa vida torna-se repleta de significado e realização. O Budismo e a prática dos Cinco Treinamentos têm muitos meios para levar mais justiça e compaixão à sociedade. Com plena consciência, compaixão e compreensão dentro de nós, agimos naturalmente, levando a cura a nossas relações, comunidade e sociedade. Devemos estar cientes das situações de injustiça, como desigualdade entre gêneros e a exclusão da mulher, a opressão de minorias, a exploração das crianças e dos pobres.

Há muitas formas de falarmos sobre injustiça e de chamarmos a atenção daqueles que sofrem e não são ouvidos. Podemos organizar passeatas para promover a paz, pois cada passo é um movimento em direção à paz. Não se trata de uma demonstração ou de um protesto, mas sim de uma verdadeira manifestação de paz, de irmandade. Podemos escrever declarações de amor a nossos políticos e representantes. Nossa sangha de Plum Village ofereceu retiros de plena consciência para policiais, membros do Congresso dos EUA, artistas e cineastas, ambientalistas, psicoterapeutas, líderes do comércio, assim como israelenses e palestinos. Os Cinco Treinamentos Budistas da Plena Consciência e os seis pontos do Manifesto de 2000 são a verdadeira prática da compreensão e do amor. São o caminho para uma sociedade justa.

O Budismo Engajado é o primeiro de todos os tipos de Budismo praticado ao longo de todo o dia, ininterruptamente, vivendo em plena consciência e concentração quando caminhamos, dirigimos, cozinhamos, vamos ao banheiro, etc. O Budismo Engajado também é a nossa prática dos Cinco Treinamentos da Plena Consciência dentro de nosso ambiente social. Praticamos a compreensão e o amor em nossa família, escola, local de trabalho, hospital, prisão, fábrica, exército, prefeitura e governo. Não precisamos usar termos budistas para trazer a prática à nossa vida diária.

A presença de plena consciência, concentração e insight, o espírito do interser, a não-discriminação, compreensão e compaixão são a própria presença do Budismo. Não temos que converter as pessoas ao Budismo, mas podemos inspirá-las a viver e trabalhar de acordo com este caminho nobre. Podemos encontrar felicidade no desenvolvimento da compreensão e da compaixão. Nosso índice para medir a felicidade, o sucesso e o progresso de nossa nação não deve ser o Produto Interno Bruto ou nosso poder aquisitivo, mas sim nosso nível de compreensão e compaixão.

Os quatro Brahmaviharas (bondade amorosa, compaixão, alegria e equanimidade) são energias ilimitadas que podem ser desenvolvidas para nossa felicidade e para a felicidade do mundo. Essas energias jamais ocorrem em excesso. A prática da produção e do consumo conscientes (o Quinto Treinamento da Plena Consciência) garante que sempre seguiremos o caminho do desenvolvimento sustentável. A verdadeira felicidade deve ser a base de nossas políticas de produção, consumo e desenvolvimento.

Nossa sabedoria é o interser, a Visão Correta Budista do mundo, no sentido de que tudo depende de todo o resto para se manifestar. Se outras espécies não podem sobreviver, então os humanos também não sobreviverão. Proteger o ambiente é proteger a nós mesmos. Não somos apenas nosso corpo e espírito, somos também nosso ambiente. Nosso ambiente é a retribuição de nossa ação coletiva (karma). Viver com simplicidade, desenvolver a compreensão e o amor, cuidar de nosso ambiente, assumir um compromisso em prol do desenvolvimento sustentável - em outras palavras, seguir o caminho do Buda.

(Parte de Texto distribuído no retiro realizado no Vietnã em maio de 2008 - Thich Nhat Hanh)
(Oferecido e traduzido por Denise Kato – Sangha Plena Consciência)
FONTE: http://sangavirtual.blogspot.com

terça-feira, 24 de setembro de 2013

"InterSer"

O primeiro capítulo do livro “O Coração da Compreensão” já é um clássico do monge Zen vietnamita Thich Nhat Than, um dos líderes espirituais e melhores tradutores das sabedorias budistas para nosso meio. Intitulado “Interser“, que segue abaixo, é um comentário simples e poderoso sobre a introdução ao célebre “Sutra do Coração” (Mahaprajnaparamita Hridaya Sutra), ensinamento essencial do Budismo que trata da interdependência de todas as coisas, ou, como o próprio Thich Nhat Hanh frisa, da inter-existência de todas as coisas. Contendo o sutra e os comentários integrais em apenas 86 páginas, o livro é uma preciosidade para todos os interessados em auto-conhecimento, em conhecimento da compreensão búdica da realidade das coisas e, além disso, da suavidade e clareza deste monge, autor também de “Corpo e Mente em Harmonia: Andando Rumo à Iluminação, “Cultivando a Mente do Amor” e “Velho Caminho, Nuvens Brancas: Seguindo as Pegadas do Buda”.

Segue o capítulo “InterSer”, em português (Editora Bodigaya, 2000).

INTERSER” (de “O Coração da Compreensão”)
Por Thich Nhat Hanh

“Se você for um poeta, verá claramente que há uma nuvem flutuando nesta folha de papel. Sem uma nuvem, não haverá chuva; sem chuva, as árvores não podem crescer e, sem árvores, não podemos fazer papel. A nuvem é essencial para que o papel exista. Se ela não estiver aqui, a folha de papel também não pode estar aqui. Logo, nós podemos dizer que a nuvem e o papel intersão. “Interser” é uma palavra que não está no dicionário ainda, mas se combinarmos o prefixo “inter” com o verbo “ser”, teremos este novo verbo “interser”. Sem uma nuvem, não podemos ter papel, assim podemos afirmar que a nuvem e a folha de papel intersão.

Se olharmos ainda mais profundamente para dentro desta folha de papel, nós poderemos ver os raios do sol nela. Se os raios do sol não estiverem lá, a floresta não pode crescer. De fato, nada pode crescer. Nem mesmo nó podemos crescer sem os raios do sol. E assim nós sabemos que os raios do sol também estão nesta folha de papel. O papel e os raios do sol intersão. E, se continuarmos a olhar, poderemos ver o lenhador que cortou a árvore e a trouxe para ser transformada em papel na fábrica. E vemos o trigo. Nós sabemos que o lenhador não pode existir sem o seu pão diário e, conseqüentemente, o trigo que se tornou seu pão também está nesta folha de papel. E o pai e a mãe do lenhador estão nela também. Quando olhamos desta maneira, vemos que, sem todas estas coisas, esta folha de papel não pode existir.

Olhando ainda mais profundamente, nós podemos ver que nós estamos nesta folha também. Isto não é difícil de ver, porque quando olhamos para uma folha de papel, a folha de papel é parte de nossa percepção. A sua mente está aqui dentro e a minha também. Então podemos dizer que todas as coisas estão aqui dentro desta folha de papel. Você não pode apontar uma única coisa que não esteja aqui- tempo, espaço, a terra, a chuva, os minerais do solo, os raios do sol, a nuvem, o rio, o calor. Tudo coexiste com esta folha de papel. É por isto que eu penso que a palavra interser deveria estar no dicionário. “Ser” é interser. Você simplesmente não pode “ser” por você mesmo, sozinho. Você tem que interser com cada uma das outras coisas. Esta folha de papel é porque tudo o mais é.

Suponha que tentemos retornar um dos elementos à sua fonte. Suponha que nós retornemos ao sol os seus raios. Você acha que esta folha de papel seria possível? Não, sem os raios do sol nada pode existir. E se retornarmos o lenhador à sua mãe, então também não teríamos mais a folha de papel. O fato é que esta folha de papel é constituída de “elementos não-papel”. E se retornarmos estes elementos não-papel às suas fontes, então absolutamente não pode haver papel. Sem os “elementos não-papel”, como a mente, o lenhador, os raios do sol e assim por diante, não existirá papel algum. Tão fina quanto possa ser esta folha de papel, ela contém todas as coisas do universo dentro dela.”

Fonte: Site Dharmalog.
http://dharmalog.com/2012/10/29/se-voce-for-um-poeta-vera-claramente-que-ha-uma-nuvem-flutuando-nesta-folha-de-papel-interser-por-thich-nhat-hanh/

sábado, 14 de setembro de 2013

Encontro Bethel 16 Lages


É com grande honra, gratidão e alegria que recebemos no dia de hoje em nossa Sangha, 
a visita dos estimados integrantes do Bethel 16 Lages.
Que todos nós possamos vibrar na harmonia, na compaixão e no amor.
Que o poderoso fluir das boas intenções e dos bons exemplos, possam inspirar todos que aqui vierem.
Namastê!!




quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A Arte de Viver e Trabalhar Conscientemente

A maneira como vivemos nossas vidas e a maneira como ganhamos a nossa vida são cruciais para a nossa alegria e felicidade. Quase metade da nossa vida é gasta no trabalho, mas como gastamos esse tempo? O trabalho que fazemos é uma expressão de todo o nosso ser. Nosso trabalho pode ser um meio maravilhoso para expressamos nossas mais profundas aspirações, e também uma grande fonte de alimento, paz, alegria, transformação e cura. Por outro lado, o trabalho que fazemos e a forma como fazemos também pode causar muito sofrimento. O que fazemos com nossas vidas e se estamos conscientes ou não determina o quanto de paz e alegria que criamos. Se nós trazemos a nossa consciência para cada momento, se praticamos a atenção plena em tudo o que fazemos, o nosso trabalho pode nos ajudar a realizar o nosso ideal de viver em harmonia com os outros e de cultivar a compreensão e compaixão.

Vivemos em um tempo e lugar onde não é fácil encontrar um emprego. Sabemos, porém, que nosso bem-estar não depende apenas de ter uma fonte de renda, mas de ter um trabalho em que possamos cultivar a alegria e felicidade, um trabalho que não seja prejudicial aos seres humanos, animais, plantas ou a Terra. O ideal é que sejamos capazes de encontrar um emprego e trabalhar de tal forma que o nosso trabalho seja  benéfico para a Terra e para todos os seres vivos.

Não importa o que o seu trabalho seja, há muita coisa que você pode fazer para ajudar os outros, criando um ambiente de trabalho feliz, um lugar onde você possa trabalhar com alegria e harmonia, sem estresse e tensão. As práticas da respiração consciente, sentar consciente, alimentação consciente e andar consciente podem contribuir para um ambiente positivo e livre de estresse no trabalho. Aprender a arte de parar, de liberar a tensão, de usar a fala amorosa e a escuta profunda e compartilhar essa prática com outras pessoas pode ter um enorme impacto sobre o nosso próprio prazer no trabalho e na cultura da nossa empresa.

Quando sabemos como cuidar de nossas emoções fortes e estabelecer bons relacionamentos no trabalho, há melhora da comunicação, o estresse é reduzido e o nosso trabalho se torna muito mais agradável. Este é um grande benefício não só para nós mesmos, mas também para aqueles com quem trabalhamos, aos nossos entes queridos, nossas famílias, e para toda a sociedade.

A energia de plena consciência (mindfulness) é o ato de trazer a atenção plena ao que está acontecendo no momento presente. Trazemos as nossas mentes de volta para os nossos corpos e voltamos para casa, para o momento presente. Ela começa com a consciência plena de nossa respiração: a nossa inspiração e expiração. Plena consciência é o tipo de energia que nos ajuda a estar totalmente presentes, viver a vida no aqui e agora. Cada um de nós pode gerar a energia de consciência. Quando você inspira e expira, concentrando-se no ar entrando e saindo do seu corpo, isso é chamado de respiração consciente. Quando você bebe um copo de água ou uma xícara de chá, concentrando toda a sua atenção sobre o consumo e não pensa em mais nada, isso é chamado consumo consciente. Quando você anda e foca sua atenção em seu corpo, sua respiração, seus pés e os passos que você faz, isso é chamado de andar consciente.

Ao trazer a nossa atenção primeiramente para a nossa respiração, somos capazes de unir corpo e mente e chegar totalmente no momento presente. A partir deste local, nós poderemos ser mais conscientes de tudo o que está acontecendo no momento presente e vê-lo com outros olhos, sem sermos apanhados pelo passado ou levados pelas preocupações sobre o futuro. Você sabe que o futuro é apenas uma noção. O futuro é feito de uma única substância, que é o momento presente. Se você cuidar bem do presente, não há necessidade de se preocupar com o futuro. Ao cuidar do presente, você estará fazendo tudo o que pode para garantir um bom futuro. Devemos viver o momento presente, de tal forma que a paz e a alegria sejam possíveis no aqui e agora, e que amor e compreensão sejam possíveis. Essa é a melhor coisa que podemos fazer pelo futuro.

Todo ato comum pode ser transformado em um ato de consciência: escovar os dentes, lavar os pratos, andar, comer, beber ou trabalhar. E, claro, a atenção plena não é apenas consciência de coisas positivas. Quando a alegria se manifesta, nós praticamos a atenção plena na alegria. Mas quando a raiva se manifesta, nós praticamos a atenção plena na raiva. Seja qual for a emoção forte que surgir, se aprendermos a praticar a atenção plena da emoção, reconhecendo a emoção e não suprimindo-a ou agindo sobre ela, em seguida, a transformação acontecerá e seremos capazes de encontrar mais alegria, paz, e conscientização.

Você pode pensar que não tem tempo para praticar a atenção plena, que o seu dia de trabalho é tão cheio e que você está ocupado demais para a prática de estar atento. Você pode pensar que a atenção plena é algo que só se pode praticar quando tiver tempo, como durante suas férias ou ao apreciar a natureza. Mas podemos praticar a atenção plena em qualquer lugar, a qualquer hora e em casa ou no trabalho, mesmo durante o nosso dia de trabalho muito ocupado. Nós não precisamos definir um tempo separado a fim de praticar. Leva apenas algumas respirações para gerar a energia de consciência e nos trazer de volta para o momento presente. Podemos praticar durante todo o dia e obter os benefícios da nossa prática imediatamente. Sentados no ônibus, dirigindo o carro, tomando um banho ou preparando o café da manhã, podemos desfrutar de fazer todas essas coisas.

Não podemos dizer: "Eu não tenho tempo para praticar." Não. Temos tempo de sobra. Isto é muito importante perceber. Quando você pratica a atenção plena e gera paz e alegria, você se torna um instrumento de paz, trazendo paz e alegria para si mesmo e para os outros. Quando chegamos ao lar do momento presente, e deixamos ir pensamentos sobre o passado ou o futuro, isso é chamado de parar. Nós praticamos o parar, a fim de estar presentes para nós mesmos e para o mundo que nos rodeia. Quando aprendemos a parar, começamos a ver, e quando vemos, nós entendemos. Desta forma, podemos gerar compreensão, compaixão, paz e felicidade.

A fim de estar totalmente presentes para o nosso trabalho, para os nossos colegas de trabalho, para os nossos amigos e familiares, é preciso aprender a arte de parar. Até  pararmos e observarmos o que está acontecendo no momento presente, não poderemos gerar alegria, consciência, ou compaixão.

Eu conheço um homem que presta muita atenção ao andar com consciência entre os compromissos de negócios. Ele caminha com atenção plena, consciente de sua inspiração e expiração, enquanto caminha entre os edifícios de escritórios no centro de Denver. Transeuntes sorriem para ele, porque ele parece muito calmo em meio a todas as pessoas correndo. Ele diz que seus encontros, mesmo com pessoas difíceis, tornaram-se muito mais fáceis e mais agradáveis desde que começou esta prática.

Casa e trabalho estão conectados. A maneira pela qual você se preparara para o trabalho, vai para o trabalho, e o jeito que você se comporta enquanto está lá, afeta não apenas aqueles com quem trabalha, mas também a qualidade do seu trabalho. Tudo o que fazemos em nossas vidas tem um efeito sobre o nosso trabalho. Eu, pessoalmente, sou um poeta, mas eu gosto muito de trabalhar no cultivo de hortaliças para o jardim. Um dia, um estudioso americano me disse: "Não desperdice o seu tempo de jardinagem com o cultivo de alface. Ao invés disso você deve escrever mais poemas; Outros podem cultivar alfaces." Essa não é a minha maneira de pensar. Eu sei muito bem que, se eu não cultivar alfaces, eu não posso escrever poemas. Os dois estão interligados. Comer o café da manhã conscientemente, lavar os pratos, e cultivar alfaces com atenção são essenciais para que eu seja capaz de escrever poesia também. A forma como alguém lava os pratos revela a qualidade de sua poesia.

Da mesma forma, quanto mais consciência e atenção trazemos para todas as nossas ações diárias, incluindo o nosso trabalho, melhor será o nosso trabalho. Nossas vidas pessoais não são separadas de nossas vidas profissionais. Nossa incapacidade de estar atentos, de trazer toda a nossa atenção para o que estamos fazendo em nossas vidas cotidianas, tem custos pessoais e profissionais. Para entender o que nos está acontecendo no trabalho, precisamos olhar para nossas vidas em casa e nossas famílias.

A prática de plena consciência ajuda-nos a construir um sistema imunológico saudável para a nossa família. Quando o vírus penetra no corpo de um organismo, o organismo toma conhecimento de que foi invadido e produz anticorpos, de modo a resistir ao invasor. O sistema imunológico é um agente de proteção. Se não há anticorpos suficientes para combater o vírus, o sistema imunológico os produz mais rapidamente, a fim de lidar com a invasão e se sustentar. Desta forma, podemos dizer que o sistema imunológico é um reflexo da consciência atenta do corpo. Da mesma forma, quanto mais atenção nós produzirmos, mais poderemos proteger e cuidar de nós mesmos.

A família é um organismo vivo que tem a capacidade de proteger e curar a si mesma. Suponha que seu filho está sofrendo. Se ele não sentir que está recebendo atenção suficiente ou que alguém o está ouvindo, ele vai tentar lidar com seus problemas por conta própria. No entanto, como as crianças muitas vezes não sabem como lidar com o seu sofrimento, elas podem tentar ignorá-lo, cobri-lo ou disfarçá-lo com um comportamento doentio.

Sofrimento não resolvido pode afetar toda a família. Se uma criança não está feliz, os pais ou irmãos e irmãs não poderão ser felizes. Se pudermos dar atenção consciente ao sofrimento do nosso filho, reconhecê-lo e cuidar dele, isso vai ajudar a criança a resolver seus problemas e curar a sua dor, o que irá beneficiar toda a família.

Ter consciência do sofrimento e encontrar formas de ajudar a aliviá-lo na nossa vida doméstica vão nos ajudar a sermos mais capazes de compreender e lidar com situações difíceis que surgem no trabalho, especialmente se estamos em ocupações de alto estresse. Precisamos saber como lidar com nosso próprio sofrimento, a fim de sermos capazes de entender os outros.

Nosso ambiente de trabalho é como um organismo vivo também. Se trouxermos o nosso estresse de casa para o nosso trabalho, pode ser como uma infecção. Da mesma forma, se trouxermos plena consciência de casa para o trabalho, a nossa presença consciente pode tornar o nosso ambiente de trabalho um lugar mais saudável e mais feliz para todos.

Podemos nos perguntar se sabemos como produzir um sentimento de alegria, ou se sabemos como relaxar e desfrutar do almoço, ou se vamos respirar antes de pegar o telefone ou antes de entrar em uma reunião difícil. Estas questões são muito práticas e muito importantes. A maneira como se vestir, escovar os dentes ou comer o nosso café da manhã também é importante. Se praticarmos atenção nessas pequenas ações diárias, saberemos como aproveitar o nosso dia, como deixar ir a tensão no trabalho e como reduzir o estresse. A prática de plena consciência pode ajudar-nos a cultivar mais consciência e alegria em nossas vidas e no nosso trabalho.

(Do livro ”Work” de Thich Nhat Hanh)
(Tradução para o português: Leonardo Dobbin)
FONTE: http://sangavirtual.blogspot.com

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Mantra de Padmasambhava

OM AH HUM BENDZA GURU PADMA SIDDHI HUM

Apresentação

Ajuda a caminhar do Não-Ser para o Ser, das trevas para a luz. Portanto, vai além da dicotomia mundana do ter ou ser. Há um refinamento sutil: não-ser ou ser. Podendo ser utilizado para remover as camadas de impurezas que existem em nossos corpos sutis e carma.

Significação
OM AH HUM BENDZA GURU PADMA SIDDHI HUM tem significados internos, externos e secretos. Tem o poder de harmonizar a mente, o corpo e o espírito daqueles que o recitam, fazendo a energia fluir com maior equilíbrio.

O que significa OM AH HUM?
OM refere-se ao corpo.
AH à fala.
HUM diz respeito à mente.
Representam as transformadoras bençãos do corpo, da fala e da mente de todos os Budas.
Internamente, OM purifica os canais sutis. AH o ar interno, o fluxo de energia. HUM, a essência criativa.
Externamente, OM purifica todas as ações negativas cometidas através do corpo. AH purifica todas as ações negativas cometidas através da fala. HUM, purifica todas as ações negativas cometidas através da mente.
Secretamente, OM AH HUM traz a realização dos três aspectos fundamentais da natureza da mente humana:
a) OM traz a realização de sua energia e compaixão incessantes;
b) AH traz a realização da sua natureza radiante; 
c) HUM a realização da sua essência semelhante ao céu.

O que significa BENDZA GURU PADMA?
Neste trecho, temos a essência e a benção da visão, da meditação e da ação, respectivamente.
A palavra BENDZA (ou VAJRA) se refere à essência da verdade, GURU representa a luminosidade e as qualidades da iluminação, e PADME diz respeito à compaixão incondicional. BENDZA (ou VAJRA) significa que a imutável e não-dual sabedoria dos Budas pode cortar ilusões e obscurecimentos sem nunca ser danificada ou destruída pela ignorância. As qualidades e atividades do corpo, fala e mente de sabedoria dos Budas têm a capacidade de beneficiar os seres com o poder penetrante e desobstruído do diamante (a mais forte e preciosa das pedras) e como o diamante a VAJRA é livre de defeitos.
GURU significa em parte, alguém repleto de todas as qualidades admiráveis que incorpora sabedoria, conhecimento, compaixão e meios hábeis. As qualidades inconcebíveis e perfeitas do GURU (o Mestre) fazendo-o inestimável e superior a todas as coisas em excelência.
PADMA significa lótus e se refere à família lótus dos Budas e especificamente o aspecto da fala iluminada que eles representam.
Quando são tomadas de maneira conjunta - BENDZA GURU PADMA - significam a essência e a benção da visão, da meditação e da ação. BENDZA refere-se à indestrutível essência da verdade que pedimos em nossas orações para realizar em nossa visão. GURU representa a natureza de luminosidade e as nobres qualidades da iluminação que oramos para aperfeiçoar na nossa meditação. PADMA diz respeito à compaixão que pedimos para realizar nossa ação.

Então, pela recitação dessas sílabas do mantra, recebemos as bençãos da mente de sabedoria, as nobres qualidades e a compaixão de todos os Budas.

O que significa SIDDHI HUM?
SIDDHI significa perfeição real, consecução, benção e realização. Nela está o potencial de remover os obstáculos de nossas vidas, abrindo caminho para nossas aspirações de Luz e de Amor. Há duas espécies de SIDDHI: ordinário e supremo.
Pelo recebimento da benção dos SIDDHIS ordinários, todos os obstáculos das nossas vidas são removidos, ao passo em que todas as nossas boas aspirações são atendidas.
Complementando, todas as várias circunstâncias da vida se tornam auspiciosas, conduzindo à prática espiritual e à realização da iluminação.
Por sua vez, a benção do SIDDHI supremo enseja a própria Iluminação, o estado de completa realização.
Assim, orando para o corpo, a fala, a mente, as qualidades e as atividades dos Budas obterão os SIDDHIS ordinário e supremo.
Finalmente, HUM representa a mente de sabedoria dos Budas e é o catalisador sagrado do mantra. É como o "Assim seja!".

O significado essencial do mantra é: "Eu o invoco, VAJRA GURU em sua benção, conceda-nos os SIDDHIS ordinário e supremo". Ou seja, “Que as bênçãos de Vajra, removam todos os obstáculos de nossas vidas e que nossas aspirações sejam atendidas”.

Pela recitação do mantra de Vajra Guru, esses elos e ou sílabas, que são a fonte da Originação Interdependente, são purificados e estamos prontos para remover e depurar completamente a camada de impurezas emocionais do carma, liberando-nos assim do Samsara.

Reflexão
A frágil base espiritual da mente inquieta do homem moderno favorece o karma negativo. É terrível essa percepção. Ao mesmo tempo, porém, é alentadora. O círculo vicioso do karma negativo, por efeito da ilusão a que estamos acometidos, vem com força total.
Resultado: menos concentração, menos tranqüilidade, mais ansiedade, mais destemperança, reproduzindo o Samsara. É alentadora porque representa o início de um processo de sensibilização. Certamente, a entoação desse mantra com fé e devoção, aliada à prática e mudança de atitudes, oportunizará no mínimo, a produção de um karma positivo.
Poderá representar a consolidação de um processo de conscientização e harmonização, no equilíbrio e na fluidez de nossos corpos e energias.




OM AH HUM BENDZA GURU PADMA SIDDHI HUM